sábado, 19 de setembro de 2009

O Dezoito Andares


18 Andares: o mais antigo condomínio da cidade





Ninguém saberá responder aonde fica o Edifício Presidente João Pessoa. Nem mesmo o mais antigo morador da Cidade. Mas o Dezoito Andares... A grande verdade é que todo mundo concorda num ponto: É o prédio mais charmoso da cidade ou “o condomínio mais antigo da capital”, como, orgulhosamente, faz questão de colocar no papel timbrado o síndico Paulo Sérgio, cidadão que lá chegou ainda adolescente. Outra unanimidade: É uma das coberturas mais deslumbrantes do litoral, com uma visão de 360º que deixa de queixo caído até os que já conheceram a Torre Eiffel.


Os historiadores dirão que é um endereço nobre: Rua Nova, atual General Osório, esquina com a Ladeira dos Pedroza, que também já foi Ladeira da Carioca, até se juntar ao Beco da Misericórdia para receber a nova denominação: Peregrino de Carvalho.


Acho que foi exatamente este ponto da Capital que encantou o carioca Ulisses Burlamaqui, um dos integrantes do movimento da moderna arquitetura brasileira, quando, contratado pelo Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Bancários-IAPB, em 1957, sobrevoou a cidade para definir o local da “primeira experiência de habitação multifamiliar em altura da cidade de João Pessoa”.


Gostaria de ter conhecido o Dr. Burlamaqui, não pelo fato de alguns dizerem que ele era um “típico playboy carioca dos anos dourados; homem bonito, culto, extremamente elegante”. Gostaria de estar ao lado dele, no teco-teco fretado ao Aeroclube, para ver o que ele sentiu no momento da escolha deste lugar.


Quem mora no Dezoito Andares logo fica convencido do seguinte: O arquiteto construiu camarotes para que as pessoas, ocupando ambientes confortáveis e ventilados, pudessem contemplar tranquilamente uma bela paisagem. Paisagem que, como um caleidoscópio, nunca cansa, nunca cai em monotonia, porque muda de acordo com as variações do tempo e da luz. Já na entrada do apartamento, ele colocou uma parede fora de esquadro para que ao abrir a porta o visitante possa sentir, em panorâmica, o forte impacto do visual extraordinário.


Dr. Ulisses Burlamaqui foi mais fundo na sua viagem: Empilhou 48 apartamentos, vazados na frente e nos fundos (o vazamento é total na frente), solução que traz para dentro dos imóveis a paisagem exterior, formando imensos painéis, o que deixa os moradores com a sensação de que vivem pisando nas nuvens. Avançou mais em seu sonho: Fez as varandas com as mesmas dimensões, quase 20 metros quadrados, independentemente do tamanho do apartamento. A paisagem foi, digamos, democratizada, até para que todos pudessem curtir igualmente o pôr-do-sol e a lua cheia.


Não jogou a dependência de empregada em uma sobra de espaço qualquer. Traçou cuidadosamente os aposentos da empregada, que são amplos, agradáveis, com total e absoluta privacidade e acesso exclusivo. Há outras bossas” no prédio, como escadarias largas, com pouquíssima inclinação e degraus espaçosos, onde as pessoas podem subir e descer, conversando ou conduzindo volumes, tranquilamente. A área de lazer é um enorme tapete entre a plataforma e o setor residencial. O elevador serve simultaneamente a dois pavimentos, reduzindo o consumo de energia, o desgaste do próprio equipamento e fazendo com que as pessoas, mesmo as mais velhas, possam se exercitar sem grande esforço físico. No entanto, uma dessas bossas” foi para mim amor à primeira vista: O longo corredor entre os elevadores dos dois blocos recebe uma luminosidade natural que o transforma numa réplica do “túnel do tempo” do Congresso Nacional. Fantástico!


O que permanece uma incógnita é o destino da garagem, mistério que até hoje não foi desvendado. Sabe-se apenas que existe ampla área ociosa, dando para a Praça Aristides Lobo, sobre a qual o condomínio não tem mais nenhuma ingerência e, tanto o Patrimônio da União como a Prefeitura, ainda não chegaram a um acordo sobre a sua utilização. Enquanto nada é resolvido, a “terra de ninguém” serve de pousada para vagabundos e moradores de rua, causando transtornos de toda espécie à comunidade ali residente.


Torci o nariz quando me ofereceram um apartamento nesse prédio de tantas histórias, alegres e trágicas, como tudo na vida. Enfrentei o samba de uma nota só dos agentes do mercado imobiliário: “Seu” Petrônio vá para a orla. O centro acabou-se, virou um lixão.” Acontece que vim conhecer a nova morada ao pôr-do-sol. Não resisti. A amiga Vitória Lima não exagerou ao afirmar que eu não comprei um apartamento, mas uma paisagem.


Sem exagero, posso dizer que sonho acordado. Deitado em minha cama vejo o Sanhauá – rio triste, que parece estar sempre indo à procura de alguém distante... O contraponto é feito pelas garças. Numerosas, se exibem cheias de juventude, como as meninas do antigo Colégio das Neves. Vagueiam em bandos ou solitárias. São lençóis brancos, esvoaçantes, sobre o casario e o manguezal. Às vezes penso que são anjos enviados por Deus para limpar, todos os dias, a sujeira do esquecido Varadouro, numa espécie de protesto pacífico contra a omissão dos homens.


Menino da Rua da República, Rua da Areia e do velho Roggers, com alguns quilômetros rodados nesses quase 60 anos de vida, penso que escolhi o lugar certo para “amarrar o burro na sombra”. Aqui, me refugio nas minhas doces lembranças e me sinto protegido pelos meus mortos, figuras que tinham a maior intimidade com essas ruas, becos e ladeiras.


PS: No final de 2006, começo de 2007, morei quase 6 meses no 18 Andares. Não resisti por muito tempo. As poluições sonora e do ar, no centro da Capital, me fizeram vender o imóvel e me mudar para a orla marítima.




2 comentários:

  1. o que você quis dizer sobre poluições sonora e do ar?

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    1. O texto não é meu. Pertence a Petrônio Souto, mas acredito que ele foi morar em outro local devido a intensidade de carros que transitam perto do edifício. Entretanto, a vista é belíssima.

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