Bem que tento me lembrar dela
como um todo, mas nos dias atuais, depois de mais de cinqüenta anos,
essa é tarefa difícil. O jeito é me satisfazer com alguns pedaços
de memória que ainda perpassam pela cabeça por onde circularam
tantos vultos de mulheres, umas lindas outras não tanto, mas todas mulheres – essas magníficas
representantes do que existe de melhor na raça humana.
Pensei em pedir ajuda a amigos
mais velhos contemporâneos de Jaguaribe, porém, desisti porque certamente
eles – bem mais afeitos à figura de Mocinha – iriam
influenciar a crônica que espero, na simplicidade das palavras, possa efetivamente
representar minha homenagem àquela figura de fêmea que enlevou os sonhos de
muitos e que, ao que soube depois, saciou a sede de poucos.
A beleza de Mocinha era típica
daqueles tempos, com uma diferença que a fazia mais admirada: enquanto as moças
ditas de família se vestiam bem e se arrumavam a seu modo, com banho de
sabonete Eucalol e pitadas de perfume Coty ou Royal Briar, Mocinha não tinha
direito a essas coisas. Ela se vestia de forma humilde e despojada o que me
leva a crer, na mente confusa que ostento, que ela sequer era da família da
casa vizinha à nossa. Estava mais para menina adotada ou alguém trazido do
interior para morar com tios mais abastados.
Em verdade, Mocinha era uma fêmea
de corpo inteiro e suas partes estavam bem dispostas nos seus devidos lugares.
Cabelos longos e pretos caíam de vez em quando sobre o rosto belo e
anguloso, bem enfeitado por uma boca carnuda e olhos castanhos,
aparentando uma candidez que ela nunca teve. Ao contrário, quem disse ter
estado com ela em contatos mais íntimos, garantia que ela era fogosa e
meio difícil de saciar. Mas essas afirmações nunca foram confirmadas, primeiro
porque Mocinha era inabordável e também porque na hora de provar os palradores
corriam às léguas.
O seu corpo, para os
padrões da época, era perfeito. Isso é o que eu pensava nas raras vezes
(o que sempre lamentei) em que, do alto de uma providencial mangueira, a
vi se ensaboando debaixo do chuveiro de cobre que pendia de um tonel de
água fria, no banheiro improvisado do quintal de sua casa. Posso dizer
que ainda hoje guardo a recordação daqueles seios pequenos e arredondados e das
pernas torneadas que apareciam antes das coxas grossas e rijas, de onde se
vislumbrava algumas penugens de um erotismo sem par.
Das outras partes, chamadas
pudicas, reservo-me o direito de sobre elas não discorrer, pois este espaço
embora livre, não permite que devaneios de outra ordem sejam criados ou
alimentados, senão aqueles que já povoaram os sonhos da minha adolescência, em
que Mocinha apareceu, sempre causando o maior estrago nos meus lençóis.
Não sei se Mocinha ainda habita
este mundo e o que foi feito dela quando a minha vida se despregou de
Jaguaribe. Não sei se chegou a se casar, se descasou, se teve
filhos e se tem netos – pouco importa. O que vale mesmo é que
num desses últimos fins-de-semana, como por encanto, Mocinha reapareceu para
mim.
E, eu que não sou tão
egoísta, resolvo dividir com os homens do meu tempo, o prazer de desfrutar dos
atributos de Mocinha, sem dúvida, uma encantadora mulher do século passado,
daquelas que já não se fazem como antigamente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado por expressar seu ponto de vista.