Pai, não repare este sexagenário querendo ser menino de novo e pedindo colo. Repare não, Seu Miguel, pois a gente só cresce para os outros, para os estranhos. Para os pais continuamos a ser meninos. E é de colo que sinto saudade agora, do seu colo protetor, do seu jeito grandão de me dar segurança e não ter medo de nada. Sem o seu colo, sem seu cafuné, sem o seu proteger, me sinto menino jogado no mundo, sem norte e sem sul.
Eu queria seu colo nesse momento, meu velho. Ele faz falta, muita falta.
Tenho quase a mesma idade sua, de quando você se foi. Muitos janeiros vivi, cabelos brancos ganhei, experiências foram somadas ao meu patrimônio de vida, vieram os filhos, chegaram os netos, mas eu sinto a sua falta. E lamento as quantas vezes o troquei pelo convívio dos amigos de ocasião, das vezes em que o deixei em casa curtindo o silêncio da velhice para ir às festas regadas a forró e cachaça. Talvez sinta isso porque, como no seu tempo, eu veja agora os meus meninos saindo de casa para curtirem a vida e eu fico aqui curtindo a minha saudade.
Somente agora, meu velho, quando não o tenho mais comigo, é que descubro como era bom estar perto de você, meu pai, meu porto seguro, braço amigo a me fazer acreditar na concretização do impossível, desde que o tivesse ao meu lado.
Lembra daquela vez que botei a mão na máquina de desfibrar agave e fiquei com os dedos pendurados, quase caindo? Você enrolou os meus dedos com o seu lenço suado e garantiu que eles ficariam colados. Eu acreditei. Sempre acreditei em tudo o que você me disse. Os dedos colaram. Ficaram meio tortos, mas colaram. Ainda hoje estão aqui para testemunhar.
As caminhadas até a Serra do Gavião, as siricolas cantando, os paus d`arcos de Seu Lindolfo delimitando as fronteiras do nosso mundo, o ranchinho de palha, o fogão cavado no morro dos cupins, a cama de vara, as histórias de trancoso contadas ao redor da fogueira, tudo isso era bonito porque tinha você como personagem principal, o herói, o mocinho invencível de épicas batalhas.
Depois eu cresci, botei o pé na estrada, fui pra longe, somente lhe via de vez em quando, nas férias ou nas suas raras visitas. Fazíamos a festa quando você descia do ônibus na rodoviária velha. Aquele guisado gostoso na lanchonete da velha gorda anunciava a volta da fartura para nós que, enquanto sozinhos, convivíamos com as vacas magras e com o tudo faltar.
Um dia, porém, você adoeceu e partiu. Foi um choque, meu velho. Você era indestrutível, invencível e imbatível. Como armar uma daquelas com a gente, comigo? Mas você se foi, sumiu dos nossos olhos, das nossas vistas, foi morar noutro plano, bem longe daqui.
E ficou a saudade, saudade que dói, que machuca, que enfraquece, que faz esse sessentão virar menino de novo e pedir colo, o seu colo de pai, o colo amigo que me livrava do frio e dos medos desse mundo.
Repara não, pai. De vez em quando a nostalgia chega, eu viro menino e sinto uma falta danada de você. Principalmente quando ela, a nostalgia, chega no dia dos pais e eu descubro que, ao contrário de muitos, não poderei abraçar o meu velho. Repara não, liga não. Essa lágrima que cai dos meus olhos é apenas um testemunho de minha saudade que jamais se finda e da sua lembrança que nunca morre.
PS.: Esse texto não é meu, mas gostaria que fosse. Não tenho altura para tanto. É do Tião Lucena. Veja esse e outros mais no Blog do tião. É só clicar neste link .
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